Desastre de Bhopal


BREVE LEITURA DOS IMPACTOS SOCIAIS CAUSADOS PELO DESASTRE DE BHOPAL[1] NA INDIA EM 1984

João Paulo Muniz Marin
Aluno do Programa de Pós-Graduação em Geografia UFGD

O presente texto, em forma de ensaio, vai tentar, muito brevemente, levantar uma discussão sobre o impacto social causado pelos processos de produção, tendo como ponto de partida uma leitura do filme Reza por Chuva, que retrata o desastre de Bhopal, o maior acidente industrial da Índia. Mas como falar de impactos sociais sem os mesmos estarem ligados aos impactos ambientais?
Para Rodrigues (2001)
“a natureza não tem fronteiras, pois estas são construções sociais. A natureza tem leis próprias que podemos transgredir e até mesmo destruir. Os homens em sociedade. Descobrem as suas especificidades, suas leis, suas características e dela retiram elementos para sua sobrevivência e para o lucro, principalmente após a implantação do modo de produção capitalista, que se dá tanto pela apropriação dos elementos da natureza como pela demarcação de propriedade em territórios e espaços. (pag. 2)

 Mas sendo esse um breve ensaio o foco será os impactos sociais diretos, causado pela indústria química, levando assim o texto para uma abordagem um pouco mais próxima das minhas pesquisas.
O filme Bhopal, A Player for Rain, foi produzindo em 2013 e lançado em 2014, sendo uma produção de parceria Índia/Inglaterra, com a direção de Ravi Kumar. No drama, o personagem Dilip consegue um emprego na Indústria Química Norte-Americana Union Carbide[2], e fica muito empolgado e feliz com sua nova posição na indústria, fazendo questão de mostrar isso aos seus colegas. Dilip é um típico indiano pobre, que antes do sonhado emprego sobrevivia com empréstimos e serviços temporários.
Na noite do dia 3 para o dia 4 de Dezembro d 1984, aconteceu um vazamento de cianeto e outros gases tóxicos da fábrica de defensivos agrícolas Union Carbide (EUA), na cidade de Bhopal, na India. Nesse ocorrido, milhares de pessoas morreram e muitas outras foram expostas com conseqüências que perduram até os dias de hoje; fala-se em um numero entre 3.500 a 7.500 pessoas mortas apenas no dia do desastre (números não oficiais), pois na verdade não existe um numero oficial, nem por parte da empresa e nem por parte das autoridades indianas, com clara intenção de atrapalhar futuras investigações e omitir as verdadeiras causas do acidente, bem como entender as conseqüências dos gases tóxicos para  humanos e meio-ambiente.
A Union Carbine, ao se instalar na India, pode utilizar-se da mão de obra barata dos moradores do local, em grande parte pessoas que moravam nas favelas ao redor da própria fábrica. Percebe-se então o quanto essas pessoas estavam vulneráveis, considerando que a fábrica processava produtos químicos altamente tóxicos, isso, por si só já não foi uma medida mínima de segurança, ou seja, não foram as pessoas que se aglomeraram em torno da fábrica e sim a fábrica que, atrás de mão de obra barata e outros benefícios se instalou no local. Considera-se também que a fragilidade das leis e da fiscalização por parte das autoridades indianas motivou e facilitou a instalação da fábrica naquele local.
A necessidade de emprego para os moradores, levaram-nos a enxergar a fábrica como algo positivo, como o desenvolvimento do e apara aquele lugar e a oportunidade de um emprego, em uma sociedade em que alguns bens materiais são necessários para a vida cultural e as relações entre as pessoas.
As mudanças ocorridas no processo de produção, a tentativa de evitar grandes impactos ambientas, a idéia de sustentabilidade parecem caminhar juntamente com grandes desastres, e como conseqüência grande repercussão na mídia.
O desastre aconteceu em tempos da chamada Revolução Verde[3], comandada pelos EUA, que buscou a mecanização/modernização da agricultura, utilização de sementes geneticamente alteradas, conforme o clima e condições de cada região, uso intensivo de fertilizantes e pesticidas para controle de pragas, agilidade, desde o processo de plantio, até a colheita e logística final da produção.
Essa nova lógica teve grandes impactos sociais e ambientais nas populações locais onde eram instaladas as fábricas. Ao mesmo tempo, com a mecanização da agricultura trabalhadores antes do campo, agora começam a migrar para as cidades, em muitos casos sem condições financeiras ou até mesmos expulsos de suas terras, buscando como alternativas as periferias da cidade ou mesmo as favelas. Esse fato também cria uma nova mão de obra para as mesmas fábricas, trabalhadores não organizados em sindicatos, com pouco ou nenhum nível de instrução e praticamente obrigado a aceitar qualquer tipo de emprego, geralmente os mais desgastantes e perigosos.
A lógica das grandes corporações foi se instalar em países que na época eram chamados de terceiro mundo ou subdesenvolvidos, levando o discurso do desenvolvimento para convencer tanto a população, quanto as autoridades dos países onde se instalavam. Dessa forma, se burlava muitas recomendações de segurança, se obtinha mão de obra barata, sem organização sindical e poucos direitos trabalhistas, pagava-se pouco aos trabalhadores e assim mantinha sua margem de  lucro como o desejado e previsto.
Para se fazer o mesmo em países como EUA e países desenvolvidos da Europa, as grandes corporações esbarrariam em uma série de dificuldades de toda tipo de ordem, ou seja, pagariam mais pela mão de obra, teriam que lidar com sindicatos, cumprir uma série de regras para a segurança dos funcionários, bem como seguir as leis ambientais, e provavelmente nem sequer poderiam utilizar todos os produtos que usavam na índia, pois muitos são proibidos em diversos países. Sabe-se que na Union Carbine da índia, nem os equipamentos básicos de proteção individual eram disponibilizados para os trabalhadores e o treinamento não era de qualidade, ou sequer existia, tendo o trabalhador que aprender o ofício na “raça”
Ao considerar os anos de 1970 e 1980, claramente sabemos que mudanças foram inevitáveis no processo de produção industrial. Mas a que custo isso se deu? E será que é o suficiente? Sabemos de quantas vidas e quantos acidentes e desastres ocorreram para que as grandes corporações fossem “obrigadas” a fazer mudanças, pela pressão de autoridades, multas pesadas e repercussão na mídia, o que pode afetar a imagem da “marca”. Sendo assim muitas “bocas” foram caladas a base de propinas e acordos.

REFERÊNCIAS

RODRIGUES, A. M. ; Meio Ambiente e Desenvolvimento. CD-ROM - Fundação Escola de Governo João Pinheiro, Minas Gerais- Belo Horizonte, 2001.
SITES
http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geografia/a-revolucao-verde.htm





[1] Bhopal é a capital do estado de Madhya Pradesh, na Índia. Tem atualmente cerca de 1 795 000 habitantes. Foi fundada em 1728 como capital do antigo principado do Bhopal.
[2] Union Carbide Corporation é uma empresa de manufatura americana, fundada em 1917, com sede em Houston, no estado do Texas. Foi incorporada pela Dow Química em 2001.
[3] A expressão Revolução Verde foi criada em 1966, em uma conferência em Washington, por William Gown, que disse a um pequeno grupo de pessoas interessadas no desenvolvimento dos países com déficit de alimentos “é a Revolução Verde, feita à base de tecnologia, e não do sofrimento do povo”.
A implantação de novas técnicas agrícolas iniciou-se no fim da década de 1940, porém os resultados expressivos foram obtidos durante as décadas de 1960 e 1970, onde países em desenvolvimento aumentaram significativamente sua produção agrícola.
Esse programa foi financiado pelo grupo Rockefeller, sediado em Nova Iorque. Utilizando um discurso ideológico de aumentar a produção de alimentos para acabar com a fome no mundo, o grupo Rockefeller expandiu seu mercado consumidor, fortalecendo a corporação com vendas de pacotes de insumos agrícolas, principalmente para países em desenvolvimento como Índia, Brasil e México.
O grupo patrocinou projetos em determinados países criteriosamente selecionados, as nações escolhidas foram: México, Filipinas, Estados Unidos, e, em menores proporções, o Brasil.

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